Eu, enquanto torta
Na falta do que fazer e porque adoro um docinho pensei numa torta mil folhas pra ilustrar o que acontece com a gente ao longo dos anos. Nossas experiências se acumulam em camadas e, de folha em folha, a pilha vai aumentando. É inevitável que a parte de baixo comece a amarfanhar portanto as rugas são consequência naturalíssima do “peso” dessas páginas da vida. A vantagem é que quanto mais alta a torta, mais longe se vê. Os idosos podem ser meio encarquilhados mas lá de cima compreendem todas as dimensões da humanidade, serenamente. Já os adolescentes tem uma visão chapada da realidade porque estão numa fase cremosa e ainda baixa do seu doce. Ficam encalhados entre milhares de certezas absolutas. Minha torta é intermediária, tem 47 andares. A essa “altura” eu já deveria ter me conformado com a chegada dos fios brancos. Mas não, vivo reclamando. Me recuso a aceitar essa cobertura açucarada antes da hora. Pergunto por que por que por que? A filha responde: mãe você tem cabelo branco porque você cresceu. Sabedoria da torta.
É nisso que dá passar o domingo em casa. (RL)